Na prática do direito fiscal em Portugal, um dos temas que mais gera dúvidas e discussões é a obrigatoriedade da nomeação de um representante fiscal para cidadãos não residentes. Embora as regras estejam definidas na legislação, existem diversas nuances que podem causar confusão, tanto para profissionais do direito quanto para os próprios contribuintes. Esta discussão é ainda mais relevante para grupos específicos, como estudantes internacionais, que, em muitos casos, não necessitam de nomear um representante fiscal.
Vamos explorar de forma detalhada as circunstâncias em que a nomeação de um representante fiscal é obrigatória e os casos em que essa exigência é dispensada, com base na legislação em vigor e nas atualizações mais recentes.
1. O que é um Representante Fiscal?
Um representante fiscal é uma pessoa ou entidade nomeada para agir em nome de um cidadão ou empresa que não reside em Portugal, para efeitos de cumprimento de obrigações fiscais. Esse representante garante que as comunicações entre a Autoridade Tributária (AT) e o cidadão não residente sejam feitas corretamente, além de assegurar o cumprimento de eventuais obrigações tributárias, como a entrega de declarações fiscais e o pagamento de impostos.
2. A Exigência de Nomeação: Quem Precisa de um Representante Fiscal?
De acordo com o artigo 19.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), a nomeação de um representante fiscal é obrigatória para cidadãos não residentes que tenham obrigações fiscais em Portugal. Essas obrigações podem incluir a entrega de declarações de impostos sobre rendimentos gerados no país, como rendimentos prediais, rendimentos empresariais, ou outros rendimentos que não sejam sujeitos a retenção na fonte (isto é, quando o imposto já é retido no momento do pagamento pela entidade pagadora ou pelo emissor do recibo).
Contudo, é importante entender que essa obrigação não se aplica de maneira automática a todos os não residentes. Existem exceções importantes, e a necessidade de um representante fiscal vai depender do tipo de rendimentos ou atividades que o cidadão desenvolva em Portugal.
3. Casos de Dispensa de Nomeação de Representante Fiscal
Algumas situações específicas estão dispensadas da nomeação de um representante fiscal. De acordo com o artigo 23.º-A do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS) e o Decreto-Lei n.º 44/2022, a nomeação de um representante fiscal não é obrigatória para:
- Cidadãos da União Europeia (UE) ou do Espaço Económico Europeu (EEE): Os cidadãos que residem em países da UE ou do EEE estão dispensados de nomear um representante fiscal se não tiverem rendimentos em Portugal ou se todos os rendimentos gerados no país forem tributados por retenção na fonte. Isso significa que, desde que os impostos sejam pagos sem a necessidade de intervenção do contribuinte, não há necessidade de uma intervenção ativa do contribuinte, e, portanto, não há exigência de nomeação de representante fiscal.
- Adesão a Notificações Eletrónicas: O Decreto-Lei n.º 44/2022 trouxe uma importante atualização, estabelecendo que cidadãos não residentes que adiram a sistemas de notificações eletrónicas desmaterializadas também estão dispensados de nomear um representante fiscal. Esses sistemas incluem o serviço público de notificações associado à Morada Única Digital (MUD), notificações através do Portal das Finanças, ou a utilização de uma caixa postal eletrónica. Essa medida visa simplificar o processo, permitindo que o cidadão não residente cumpra suas obrigações fiscais sem intermediários, desde que esteja apto a receber notificações fiscais eletronicamente.
- Cidadãos sem Rendimentos em Portugal: Outro grupo que está dispensado de nomear um representante fiscal são os cidadãos que não geram rendimentos em Portugal. Se o cidadão não tiver qualquer atividade geradora de imposto no país, como aluguéis, vendas ou prestação de serviços, ele não precisará de um representante.
4. A Situação dos Estudantes Internacionais
Um exemplo prático e muito discutido nos balcões das Finanças é a situação dos estudantes internacionais. Muitos estudantes estrangeiros que vêm a Portugal com o visto D4 (visto de estudante) não possuem rendimentos no país e, portanto, não são obrigados a nomear um representante fiscal. Ainda assim, algumas repartições fiscais exigem a nomeação de um representante por falta de clareza sobre a equivalência do visto de residência ao título de residência para efeitos de obtenção de NIF (Número de Identificação Fiscal).
Contudo, de acordo com a interpretação da legislação fiscal, estudantes internacionais que não geram rendimentos em Portugal estão isentos da nomeação de um representante fiscal, desde que seus rendimentos sejam integralmente tributados na fonte, ou simplesmente inexistam.
5. Riscos e Penalidades
Embora a dispensa de nomeação de um representante fiscal seja possível em várias situações, é fundamental que os contribuintes cumpram corretamente suas obrigações fiscais. O não cumprimento da nomeação de um representante fiscal quando exigido pode resultar em coimas que variam entre € 75 e € 7.500, além de impedir o exercício de direitos junto à AT, como reclamações, recursos ou impugnações.
6. Conclusão
A legislação portuguesa oferece um conjunto de regras que visam simplificar a vida dos cidadãos não residentes no que diz respeito às obrigações fiscais. A dispensa de nomeação de um representante fiscal é uma dessas medidas, desde que o cidadão atenda a certos critérios, como ser residente na UE/EEE, aderir a notificações eletrónicas ou não gerar rendimentos em Portugal.
Para muitos, como estudantes internacionais, esta dispensa pode evitar a burocracia adicional de nomear um representante fiscal, desde que suas atividades em Portugal estejam em conformidade com as exigências legais.
Se houver dúvidas sobre a necessidade de nomeação de um representante fiscal, é sempre aconselhável procurar orientação jurídica especializada, a fim de garantir que todas as obrigações fiscais sejam devidamente cumpridas e que o contribuinte não enfrente sanções por desconhecimento das regras.